A importância das intervenções do Estado em
momentos de crise econômica mundial como a atual foi consenso entre
todos os debatedores do seminário “Política Industrial e
Desenvolvimento”, realizado pela CUT, nesta terça-feira (9), em
Brasília.
O presidente da ABDI(Agência Brasileira de
Desenvolvimento Industrial) e secretário Executivo do ministério do
Desenvolvimento, Mauro Borges Lemos, disse que a crise atual é
semelhante à de 1929 e não podemos correr o risco de realizar um
grande debate ideológico sobre como enfrentar a crise, como ocorreu
naquela época, em que se defendia a não intervenção do estado, o
que acabou provocando a grande depressão na década de 30.
“O
capitalismo só se recuperou com um grande programa de gastos
públicos, que ignorou a visão liberal de que o Estado não devia
intervir naquele momento crítico”, frisou.
Artur
Henrique, presidente da CUT, concordou que as intervenções do
Estado são inquestionáveis, mas lembrou que, ao elaborar políticas
para revigorar a indústria, é fundamental que o governo lembre
também da importância do fortalecimento do mercado interno e que,
para isso, é necessário também fortalecer o salário, a renda, o
salário mínimo.
“É, no mínimo, uma burrice o discurso
do ministro da Fazenda, Guido Mantega, de que não pode ter aumento
de salário neste momento,” criticou Artur.
Mercado
interno – Borges Lemos afirmou que é exatamente essa a
orientação da presidenta Dilma Rousseff. Segundo ele, a presidenta
determinou que a política industrial tem de fortalecer o mercado
interno, um dos eixos do Brasil Maior, que estão alinhados a outros
dois: investimentos em inovação tecnológica e qualificação
profissional.
“O que sustenta nossa política industrial
é a inovação, a qualificação e o fortalecimento do mercado
interno,” disse ele, que fez questão de ressaltar a importância
da iniciativa da CUT de realizar este seminário sobre o plano Brasil
Maior porque, segundo ele, essa política industrial está em
construção e a presença dos trabalhadores na elaboração da mesma
está garantida.
O presidente da ABDI falou ainda sobre as
diretrizes do Brasil Maior, detalhando as relações entre cada uma
das medidas com as questões trabalhistas levantadas pelos dirigentes
da CUT. Sobre o fortalecimento das cadeias produtivas, por exemplo,
ele explicou que é preciso combater a importação que representa
uma ameaça ao emprego em setores intensivos em mãos de obra como o
de calçados e o têxtil.
“Essa é uma das principais
diretrizes do plano”, disse, complementando: “Os
instrumentos que estamos usando para combater essa ameaça são a
desoneração da folha, o financiamento público e a regulação do
mercado de trabalho, inclusive, o fortalecimento do ensino
técnico”.
Borges Lemos falou ainda sobre ampliação de
novas competências tecnológicas e de negócios e qualificação
profissional que, afirmou, “é o maior gargalo para a economia
brasileira dar um salto de qualidade neste momento. É um desafio do
governo, uma questão chave para a gente”.
Desoneração
– Quanto à desoneração de tributos, o presidente da ABDI disse
que as medidas implementadas pelo governo eliminam diretamente os
tributos aos investimentos e que isso foi feito para defender o
emprego.
“O Brasil é uma das únicas, se não for a
única, economia do mundo que tributa investimentos. Ou seja, onera o
emprego, compromete a renda e a qualidade de vida da população”.
A
posição contrária da CUT à desoneração – a CUT é contra a
maneira como a desoneração foi decidida, sem debate com os
trabalhadores, sem diálogo social – ajudou a acender um sinal
amarelo, disse Borges Lemos, que acrescentou: “mas é uma
política de garantia de emprego. Estamos convencidos de que essa
medida é relevante”.
O secretário Executivo do
ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) falou sobre a importância
de medidas como conteúdo local e mercado de derivativos e disse que
“a FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos, do MCT, está
sendo robustecida com aumento no volume de recursos que vão
financiar a inovação tecnológica, pesquisa e desenvolvimento”.
O
economista Anselmo dos Santos, pesquisador do Centro de Estudos
Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit/Unicamp), concordou que o
Estado tem de ter participação incisiva, mas que a política
industrial tem de ter impacto direto na preservação do emprego e
também na geração de emprego de qualidade. “Não há nada
claro no Brasil Maior que possa traduzir na melhoria das condições
de trabalho e remuneração”, completou.
Anselmo também
destacou que é preciso ampliar o acesso das informações aos
trabalhadores para que os dirigentes sindicais possam monitorar os
impactos das medidas. Ou seja, está sendo gerado mais emprego? Onde?
Quantos? Com que qualidade? E como estão os salários? E a
produtividade?
A política industrial, segundo o economista,
tem de impulsionar ganhos de produtividade e pensar questões de
segurança e saúde do trabalho, tem de reconhecer convenções da
OIT que asseguram garantia de emprego.
“Grande parte dos
brasileiros não tem carreira, não tem estabilidade por conta da
alta rotatividade”, encerrou ele.
O presidente da CUT
reconheceu que a crise é gravíssima e exige medidas importantes,
mas criticou o fato de a crise ser fruto de uma decisão econômica
de deixar o mercado resolver os problemas que forem surgindo; e,
especialmente, a falta de diálogo e negociação e também de
medidas que combatam as causas da crise, que, segundo ele, são
câmbio e juros.
“A CUT concorda que é fundamental tomar
medidas para fortalecer a economia brasileira. Isso vale para a
transferência de tecnologia, vale para compras governamentais etc.,
e também que temos de estimular a exportação de produtos de valor
agregado, articulando com uma integração produtiva na América
Latina. Concordo que isso é papel do Estado. O que faltou foi atacar
as causas, que são câmbio e juros”, apontou.
Contrapartidas
sociais – Para Artur Henrique, no diálogo aberto agora, depois
que a CUT se recusou a participar da cerimônia de lançamento do
Brasil Maior, vamos ter de discutir seriamente a questão das
contrapartidas, que não são só emprego, ressaltou.
“JBS
Fri Boi, por exemplo. Vamos continuar financiando empresas como essa
que tem o maior índice de LER/Dort do país? Vamos continuar sem
cobrar contrapartidas como respeito as entidades sindicais
representativas, negociação coletiva, salário e emprego decente?”,
questionou.
“Não basta a boa intenção de quem está
elaborando as medidas”, disse Artur, que mostrou uma reportagem
publicada no jornal Valor Econômico desta terça-feira (9), onde um
executivo de um grupo têxtil, setor que acabou de ser beneficiado
com desoneração da folha, prevê queda nos índices de emprego do
setor.
“Esse sujeito acabou de ter sua folha desonerada,
mas não está nem aí para o emprego, para a saúde, para a
segurança. Tem de exigir isso, tem de estar escrito no papel, senão
parte do empresariado brasileiro não vai estar nem aí para
contrapartidas. Vamos colocar o texto da Convenção 158 na Medida
Provisória”, salientou o dirigente sindical.
O correto,
disse Artur, seria debater Reforma Tributária, como a CUT vem
pedindo há 4 meses, para acabar com a injustiça tributária, meter
o dedo no setor financeiro, ter acesso aos dados de faturamento deste
e de outros setores para, só a partir daí, discutir alíquotas de
desoneração.
“Nós queremos debater o que está escrito
na Constituição de 88 sobre seguridade social – a vinculação de
recursos, tirou daqui, vai para lá -, tem de cobrar mais dos setores
que empregam menos; não é o ministro que decide”, concluiu.